Tuesday, April 2, 2013

Terapia Larval: Uma alternativa eficiente para o tratamento de lesões cutâneas


         Desde o Velho Mundo relatam-se infestações de moscas sobre os homens. Na bíblia foram citadas no antigo testamento em Êxodo (8: 20-31), onde o Senhor pede a Moisés para dizer ao Faraó: “deixa partir o meu povo para me prestar culto. Se recusares, mandarei moscas sobre tua pessoa, tua gente, teu povo, tuas casas...”. Esse estigma ainda hoje persiste, fazendo com que as moscas sejam vistas como seres repugnantes e nocivos pela maioria das pessoas. No entanto, entre os Bamilekes e os Bamuns (Nijinji) - povos situados em Camarões, África - esses pequenos insetos eram vistos como símbolo da solidariedade e entre os gregos, a mosca era considerada um animal sagrado, ao qual referiam-se até certos nomes poderosos como os de Zeus ou Apolo, pois acreditava-se que ela poderia evocar o turbilhão da vida olímpica ou a onipresença dos deuses (Chevalier,1906).
       Chrysomya megacephala (Fabricius, 1794), C. albiceps (Wiedemann 1819) e C. putoria (Wiedemann, 1818) (Insecta:Diptera: Calliphoridae)  são espécies de moscas varejeiras originárias da África, Mediterrâneo e Oriente Médio (Gagné, 1981), foram introduzidas no Brasil na década de 1970 quando, nos anos de 1975 e 1976, embarcações que transportavam refugiados de Angola e de Moçambique, animais domésticos e diferentes tipos de alimentos, aportaram nas costas do Sudeste do Brasil. A partir daí, disseminaram-se por diferentes regiões do país (Guimarães et al., 1979), encontrando-se, atualmente, em diversos biótopos: rural, urbano e florestal, prevalecendo sobre as outras espécies de califorídeos em algumas regiões (Guimarães et al., 1978; Souza & Linhares 1997; Carraro & Milward-De-Azevedo, 1999: Marinho et al., 2006).
        Devido ao seu apurado olfato, dípteros da família Calliphoridae  são atraídos por matéria orgânica em decomposição, sendo encontrados em lixões, cadáveres, lixos hospitalares, entre outros ambientes; utilizam-se desses substratos como meio proteico ou para oviposição, por isso, transportam vários microrganismos através de suas patas, atuando, desta forma, como vetores mecânicos de agentes patogênicos, entre eles: enterovírus, bactérias entéricas, esporos de fungos, cistos de protozoários de ovos e larvas de helmintos (Greenberg 1973; Furlanetto et al., 1984;  Campos & Hársi 1984: Queiroz et al., 1999).
      Sabe-se que a mosca varejeira tem um papel fundamental na natureza, sendo decompositora de matéria orgânica, alimentando-se de resíduos e/ou carcaças em estado de putrefação. Algumas espécies, alimentam-se somente de carne em estado de putrefatação e por terem hábito alimentar necrófago, convivem com numerosas bactérias, deste modo, acredita-se que desenvolveram a capacidade de controlá-las. Essa característica específica,vem sendo aproveitada de forma benéfica por diversos cientistas ao redor do mundo e é conhecida como Bioterapia.
       As larvas secretam substâncias com ação antimicrobiana, principalmente contra Streptococcus pyogenes e Streptococcus pneumoniae(Pavillard & Wright, 1957). Por se alimentarem de tecidos de animais em decomposição, conseguem destruir material desvitalisado e, por uma série de mecanismos, auxiliam na cura de lesões cutâneas (Muncuoglu et al., 2007). Larvas são utilizadas para limpeza de feridas infectadas, como, por exemplo, no tratamento de feridas de pele pós-cirúrgicas decorrentes de diabetes e necrosadas, bem como, para úlceras, lesões traumáticas, gangrenas intratáveis e alguns tumores de pacientes com diabetes e até alguns casos de câncer visando à remoção de tecido necrosado (Sanchez et al., 2004)
     As larvas de moscas necrobiontófogas atuam na ferida à partir da digestão de tecido morto, restos celulares, exsudado ou feridas necróticas. A digestão extracorporal é feita devido a liberação de enzimas proteolíticas (colagenases, tripsina e quimiotripsina), mecanismo  através do qual as feridas são limpas. O desbridamento é auxiliado pela ingestão do tecido liquefeito e também devido ao rastreamento das larvas sobre o leito da ferida, além da maceração feita pelos ganchos orais (Sherman et al., 2000).  Há estímulo a migração de fibroblastos auxiliando na remodelação da matriz-extracelular, assim como o aumento da atividade angiogênica, atividade anti-microbiana,  impulso à uma resposta anti-inflamatória e inibidora pro-inflamatória, quebra do biofilme no leito da ferida e alteração do pH da ferida, diminuindo assim, o tempo de cicatrização (Prete, 1997;  Muncuoglu et al., 2001; Horobin et al., 2006; Cazander et al., 2009, 2010; Zhang et al., 2010, Van Der Plas et al., 2010).


     Fotos gentilmente cedidas pelo Dr. Marack Cambal via email pessoal em 27.04.2012

Sequência: a) Lesão com tecido necrosado, b) Ferida recebendo hidrocolóide que servirá de gaiola para               receber as larvas na ferida, c e d) Larvas aplicadas na ferida e cobertas por tecido telado para respiração dos insetos, e) Larvas em 3º ínstar sendo retiradas da lesão após tratamento (estas serão incineradas), f) Ferida com tecido de granulação pronto para cicatrizar.




Fontes:1)Dallavecchia, DL.2013. Comportamento Biológico de Chrysomya megacephala (Fabricius, 1794), C. putoria (Wiedemann, 1818) e C. albiceps (Wiedemann, 1819) (Insecta: Diptera: Calliphoridae) para Utilização de Bioterapia no Brasil. Dissertação de Mestrado,   Biodiversidade Neotropical, UINIRIO, Rio de Janeiro, Brasil.
2) Cambal M, Labas P, Kozanek M, Takac P & Krumpalova Z. 2006. Maggot debridement therapy. Bratislava Medical Journal107(11-12):442-444


7 comments:

  1. Queria ter pedido autorizaçao pra usar essa foto no meu seminario qdo falei de terapia larval, mas na época nao encontrei o blog... Bjos! Denise

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    1. Essas fotos foram-me cedidas pelo Dr. Cambal, também tenho outras do Dr. Sherman. Aliás, tenho muito material,quando necessitar, é só avisar. Bjs

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    2. Boa noite daniele. Estamos fazendo um TCC onde abordaremos a gestão do biofilme e o tratamanto com larvaterapia. Estamos precisando de algumas imagens. Vc poderia passar as fontes das mesmas?

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  2. Polaco sou biologa e estou desenvolvendo um projeto sobre a TL, podemos nos comunicar por email!!! Pode ser? ???? O meu e tatibalu@hotmail.com

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    1. Claro que sim. Escreva-me: danieledallavecchia@gmail.com Abraços

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